Raul acordou com vontade de mudar.
De fazer algo diferente. Revolucionar a sua vida e a algumas mais. Mas não
consegue sair da mesmice e viver revolução. Apenas sonha com a vitória, porém
anda na rotina de alguém cansado e angustiado. Vive limitado pelo seu próprio
medo e acomodação. Sente pena de si próprio e, às vezes tenta rever conceitos
nunca vivenciados ou aprendidos. Procura realizar provas sem preparos. E, deste
modo fracassa todas as vezes. Reprova dia após dia, pois não pensa três segundos
sobre o que deve fazer. Então levanta disposto a mais um dia sonhado e mal
planejado. Acorda com vigor físico e empecilhos mentais. Raul demora na hora de
mostrar a virtude. É covarde. É ignóbil. É vil.
Ele sabe. É ciente disso.
Não consegue desgarrar do passado nenhum segundo. Vive lamentando as derrotas
passadas ao invés de superá-las. Lembra dos acontecimentos pretéritos, e, ainda
assim lamenta dizendo que devia fazer e falar diferentes do jeito que agiu. Mas
não! Há uma cortina. Não só uma, mas duas ou três. Tampam o seu horizonte. Tão
novo. Tão jovem. Tem uma catarata nos seus olhos. Doença de velho. Mas os
velhinhos podem. Estão cansados de viver. Para que mais? Raul não se cura. Não
admite o seu desdém. E fala todo dia que vai mudar:
- Ah! Eu vou mudar hoje.
Ele é uma estrada plana cheia
de curva. Sempre disseram que ele devia ser como uma escada, sempre subindo. De
degrau em degrau. A cada dia subindo um degrauzinho. Ele é diferente, para em
certos lugares sem saber para onde ir. Almeja a estrada plana. É só isso que
sabe fazer. Tem tantos talentos. Pernas boas para correr e subir escadas. Tanta
sabedoria. Mas se cala na hora de falar. Tagarela no momento de silenciar. É só
isso que sabe fazer. Coisas certas em horas erradas.
Se sente estranho diante de
alguns. É louco. Parece mais um camaleão. Dissimulado. Mas não o é. Apenas
busca adaptar-se em lugares esquisitos, com pessoas escabrosas. Sabe que é
assim. Sabe que tem que ser assim.
Pessoa estranha. Sonhador e
amarrado. Não é mesquinho. Tem muitos amigos, apesar de tudo. Tem aparência de
brasileiro. E isto é crível. Pensa sobre tudo, mas todos discordam das suas
idéias. Já disse, ele é louco, porém amigável. Tem amor e dissabor.
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