segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

A ligação

A Ligação

Quando criança viveu um pouco mais a frente de uma infância comum. Aprendeu a amar muito cedo, coitado. Apaixonou-se por uma amiguinha. Linda de doer, segundo ele. Muitos anos se passavam e não se esquecia desse pequeno romance unilateral. A menina nem imaginava esse amor todo. Ela era criança. Não entendia nem o que era isso. Só sabia brincar com seus oito anos. Não queria entreter-se em beijinhos sérios. O seu nome é Alexandra.
Raul não saía dessa época, talvez seja por isso que é muito irresponsável com a vida. Ainda é criança apaixonada. Naqueles tempos divertia-se com todas as brincadeiras que um moleque pode aprender. Não tem do que reclamar da infância. Foi boa. Foi excelente. Basta ver o sorriso de filho único e mimado. Ele era único, mas nunca só. Tinha muitos amigos, talvez até milhares. Em cada tempo tinha vários deles. Que sumiam com o passar dos anos. Com as mudanças de lugares. Teve pais ausentes, porém não lhe faltava cuidados. Era bom estudante, boas notas, bom comportamento. Passava férias em lugares distantes. Com parentes, tios, avós, primos dos pais. E cada lugar que visitava e feriava descobria muitas amizades e aventuras. Soube aproveitar bem o tempo de menino. Coisa que não aprendeu na adolescência.
Raul cresceu e não se esqueceu da sua amiguinha. Ficou jovem e já crescia os seus pêlos pubianos. Conheceu a garota em um lugar um pouco distante de onde morava. E buscou encontrá-la de algum modo. Se expressar de alguma maneira e recuperar o tempo perdido. A sorte foi a internet, endereços eletrônicos e sites de relacionamentos. Procurando insistentemente ele a encontra muito mais bela e saliente, através das fotografias. De início, Alexandra nem lembra quem era ele. Mesmo assim, os dois começam a trocar correspondências. E logo em seguida, telefonemas. Mas é só amizade, apesar de Raul ser apaixonado. Devido a este defeito as ligações começam a ser mais raras. Com intervalos mais longos. E nisso, passou – se dois anos ou mais sem se falarem. Ele a esqueceu. Não por completo, mas a paixão acabara.
Raul, nesse intervalo, já com dezessete anos, conheceu outra garota e, com esta, namorava. Olhando muito para trás não esquecia o amorzinho da infância. O sentimento acabou, mas as lembranças ficavam acorrentadas em sua mente tola.
Tinha o número de telefone da amiguinha guardado em uma agenda antiga. Em um momento lembrava-se dos episódios da infância. Segurou forte o telefone e hesitou um pouco em ligar. Após alguns instantes de dúvida, ligou. Com um pouco de medo de não ser reconhecido falou um pouco trêmulo:
 - Alô!
Para sua maior surpresa no outro lado da linha quem atende é um rapaz com uma voz rude e grosseira. Parecia mesmo que ele estava muito irritado:
 - Alô, quem é?
 - É... Por gentileza, Alexandra se encontra?
 - Quem é que está falando?
 - É um amigo antigo dela.
 - Ah! – ainda em tom irritado ele gritava – então é você que anda ligando para ela? Olhe, eu sou o namorado dela. Por favor, não ligue mais. Veja se você desiste dela. Não ta vendo que ela está comigo? Respeite o nosso namoro. Se eu te encontrar em algum lugar, te bato.
 - Mas veja... – e desligou o telefone.
Raul ficou surpreso. Já existia alguém na vida dela. Mas além desse “alguém” que gritava enraivecido, existia outro. Ela é fiel a este “alguém”, mas ele é muito ciumento. Raul desligou o telefone achando aquilo engraçado. Foi fazer as suas obrigações e logo em seguida o telefone retorna:
- Alô!
- Alô, quem é?
- Raul, pois não!
- Oi Raul! É Alexandra – estava aos prantos – eu queria pedir encarecidamente que não ligue mais pra mim. Nunca mais!
- Alexandra... – e mais uma vez o telefone é desligado sem poder responder.
Raul só queria conversar sem intenções. Desejava contar as novidades. Isso o entristeceu. Não teve tempo de respostas. De trocar informações. Ele escutou um “nunca mais”. Doía no peito de Raul. Sofria ardente. Não pelo fato de ter perdido alguém, mas só pelo fato de desarraigar do passado.

O passado deixava Raul preso nas suas expectativas futuras. O impedia de crescer e de projetar-se na vida. O velho ficava nele de modo espetacular. De maneira viva. A pior coisa para Raul é deixar o passado. Mesmo que ele seja ruim. Raul amava o velho porque se achava antiquado. O seu passado foi mais aventureiro e mais bem quisto.

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